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Agora um Poema III: José

Atualizado: 26 de set. de 2019


Pobre ser humano, com tanta correria na cidade, tanta duvida tantos desastres, preambula sem saber o que fazer sem saber como fazer ou com quem fazer. Um retrato da nossa sociedade, de quem perdido não sabe o que fazer nem pra onde ir, só sabe que precisa seguir e nem sabe pra onde.

Assim em poema quase que musicado que Carlos Drumond de Andrade retrata um José qualquer um homem, um eu, um você ou um Ele no poema:



José

"E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José? e agora, você? você que é sem nome, que zomba dos outros, você que faz versos, que ama, protesta? e agora, José?

Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora, José?

E agora, José? Sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro, sua incoerência, seu ódio — e agora?

Com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora?

Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse... Mas você não morre, você é duro, José!

Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, sem teogonia, sem parede nua para se encostar, sem cavalo preto que fuja a galope, você marcha, José! José, para onde? "

(Carlos Drummond de Andrade)

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